domingo, 23 de março de 2025

Pensamentos pós IV-VI Remastered

Uma das análises de IV-VI Remastered bem descreve o que eu sinto, de forma geral, quanto aos jogos inclusos nessa coletânea: eles não são essenciais. Ao contrário de I-III Remastered, os jogos presentes nessa segunda leva de remasterizações da Aspyr não eram exatamente populares quando foram lançados décadas atrás, e temo que voltar a colocar os holofotes em um dos jogos em particular não será exatamente vantajoso.

Eu já havia escrito e publicado uma análise no portal PSX Brasil na ocasião do lançamento, portanto nessa postagem vou me limitar a pensamentos mais específicos que talvez não fariam sentido para o público em geral — e provavelmente não são condizentes com pensamentos de outros fãs.

The Last Revelation é gigantesco e maçante. Tentando entrelaçar com outras atividades e atribuições, fiquei semanas ali: após a primeira partida, ainda joguei outras duas partidas completas em busca dos troféus faltantes. Quisera eu estar na minha adolescência, quando o conceito de tempo parecia tão menos imponente.

Essa remasterização insere movimentos e animações inéditas, algumas das quais pouquíssimo usei — virar automaticamente para pendurar-se em beiradas aos seus pés chega a ser inútil, afinal estamos programados para simplesmente rolar ou recuar da distância certa. Já outros movimentos se provam indispensáveis, como cambalhotas enquanto rasteja ou para sair de espaços estreitos (ambos já existiam em I-III Remastered), e, agora, podemos virar enquanto pendurada em barras de teto. 
 
Outro truque "que não está no gibi" é apertar Caminhar duas vezes rapidamente no inventário para ir imediatamente até os óculos de sol, que centralizam opções de salvar e carregar a partida, além da indispensável tela de estatísticas. Isso é importante pois, principalmente em TR4, a quantidade de itens que Lara carrega simultaneamente beira o ridículo.

Salvo algumas exceções, é seguro dizer que visualmente falando o trabalho continua absolutamente excelente — na verdade, talvez esteja até melhor que a trilogia anterior. Os efeitos de iluminação estão magníficos, como as sombras dos pilares em Karnak ou raios solares ocasionalmente penetrando os céus partidos em Gizé, complementados com pequenos detalhes como partículas de areia voando.
 
Essa nova roupagem é deslumbrante, e chega a ser engraçado alternar o modo gráfico para o visual "original" pois esse agora transparece uma sensação de ambientes estéreis, vazios e sem vida. Não é necessariamente uma verdade universal, mas a remasterização tornou até mesmo Cairo um lugar mais tolerável e interessante de se navegar — da mesma forma que Londres foi essencialmente salva na remasterização de Adventures of Lara Croft.
 

 
Uma mudança que eu não aprovo é fazer com que Lara sofra dano de suas próprias granadas. Sempre me incomodo quando autores ativam esse recurso em seus níveis do Level Editor, e aqui não é diferente. Isso torna o lança-granadas basicamente um peso morto. Felizmente, por algum motivo ou outro, essa lógica não se aplica à besta, que por si sempre foi uma opção melhor de qualquer forma pelo alcance e velocidade das flechas explosivas.

Eu ainda considero Atlantean Scion o epítome e o melhor dos jogos da saga clássica, mas TR4 é o que conta com a melhor história e narrativa — algo que até então eu erronamente atribuía a AOD. É óbvio que eles queriam dar um grande desfecho para a protagonista, mas a ganância da Eidos falou mais alto a longo prazo (felizmente?).

E aí entra Chronicles. A história do jogo é fraca, desrespeitando o cânone ao colocar aventuras em datas contraditórias a eventos já estabelecidos nos jogos anteriores do próprio estúdio, e acho que é válido considerá-las como uma série de "e ses...". Eu acho que a abordagem de multiverso seria ideal para a franquia como um todo, considerando a quantidade de versões de Lara Croft que já vimos entre as diferentes mídias pela qual a franquia já passou. O conceito de Reflections não era ruim, honestamente, mas acho que as diferentes iterações não precisam interagir entre si.

Ou, no caso de TR5, podemos usar um argumento que ganha popularidade entre os fãs: tratam-se de recordações das aventuras sendo contadas por amigos de Lara, e talvez eles estejam confundido datas ou exagerando certos detalhes, afinal não estavam ao lado da moça o tempo inteiro...

Visualmente, a remasterização também faz um excelente trabalho em dar uma vida nova a esses cenários. Além da quantidade menor de níveis, os ambientes tendem a ser menores e mais lineares, talvez por isso o esmero seja mais evidente — mas não se engane, certos níveis de TR4 contam com tanto carinho quanto, dentro do que a limitação de tantos túneis e areia permitem.


E, por fim, Angel of Darkness. Joguei do começo ao fim, pela primeira vez, a versão localizada em português para poder escrever a análise para o PSX Brasil, e me peguei rindo muitas vezes com o nível de ridículo. Mas não estou desprezando o trabalho de localização: sob um olhar mais crítico, a performance original não é em nada melhor, justamente por conta de frases e diálogos esdrúxulos. Pérolas como "minhas pernas estão mais fortes agora" jamais deveriam ter saído do papel.
 
Conforme você progride na campanha, é evidente que a história sofreu incontáveis cortes, mas a edição final não se sustenta sozinha. Para provar sua inocência, Lara parte em uma cruzada vingativa contra o mundo inteiro. E em lugares públicos, mas, felizmente, Paris está deserta. O tal do Monstrum — Eckhardt? Karel? Quem sabe, afinal — está sempre ao seu redor sem que ela jamais suspeite. E Karel ser um transmorfo, capaz de mudar até mesmo de roupas instantaneamente, torna toda a história digna de esculacho. No passado, eu dizia que a história era uma das poucas coisas boas que o jogo tinha. Não mais.
 
A quantidade de furos no roteiro cresce a medida que o jogo avança. Boaz, desesperada, afirma que não pôde exterminar o proto-nefilim pois precisava do fragmento de periapto que estava sob posse de Eckhardt para isso, e, de fato, Kurtis só conseguiu abater a criatura quando a apunhalou com um de seus fragmentos. Pouco mais tarde, os três fragmentos são usados para eliminar o alquimista Eckhardt — que apesar de ser admirador da raça, por si não era um nefilim —, momentos antes do último nefilim vivo revelar sua real forma. 
 
Na primeira interação entre os dois, Lara já o conhece por nome e tenta usar lógica e razão contra ele, tentando convencê-lo a matar o espécime adormecido logo acima deles. Ele recusa, obviamente. Mas, para sorte de Lara, simplesmente encostar a luva de Eckhardt na perna da criatura adormecida não apenas cria um raio de luz destrutiva, como tal raio também segue e atravessa o outro nefilim que até então estava voando em círculos no local. Zero fragmentos de periapto envolvidos no processo. Baita raça superior. Mesmo o "fracassado" Proto foi tão mais resistente...
 
E tendo visto a forma como Eckhardt (ou Karel?) opera, o que diabos atacou Arnaud afinal? Foi o único sobrevivente dos ataques, mas não parece ter sido nem profanado, como Von Croy, e nem simplesmente carbonizado, como Luddick. Ao invés, de alguma forma, teve parte de seu corpo transformada em algo completamente diferente de tudo no jogo. E a rapidez com que isso é relevado só realça como nada nesse jogo funciona.

Aliás, a própria Lara de forma geral se comporta de forma emo e bipolar o jogo inteiro. Entendo que muitos fãs da franquia sintam algum tipo de conexão ou nostalgia por esse jogo em particular, ou pela mudança comportamental da protagonista — certamente agiam da mesma forma em 2003 —, mas não consigo entender. E, honestamente, não quero. Esses mesmos fãs costumam ser irredutíveis, e francamente todos estamos velhos demais para esse tipo de discussão sem fim que torna a comunidade como um todo praticamente intolerável.
 
Mesmo com as restaurações que o jogo recebeu, continua sendo o mesmo jogo de outrora, mas os controles modernos o tornam ligeiramente mais palatável. Ligeiramente. Continuei dependente do recurso de salvamento e carregamento rápido para praticamente todos os pulos e seções de plataforma, pois muitas das animações dos protagonistas continuam lerdas e irresponsivas demais. Isso sem falar no combate, que continua tão ruim quanto eu lembrava. De forma geral, simplesmente não é um jogo divertido. (E no New Game+, então, menos ainda.)
 
 
Ao contrário das outras cinco remasterizações, visualmente AOD pouco parece melhor que a versão original. Na maior parte do tempo, parece apenas ser um pacote de texturas de alta definição, com exceção dos modelos de (alguns) personagens. Quando eu conferi Soul Reaver 1 & 2 Remastered, citei que isso poderia vir a acontecer com base no pouco que víamos no material promocional do jogo.
 
Enfim, como eu disse lá no começo, hoje tenho certo receio do que a Crystal Dynamics planeja para o futuro da franquia, intencionalmente colocando holofotes nesse "injustiçado" título — e recentemente ainda tivemos uma skin para Fornite, e suspeita-se que existirá uma Funko Pop com esse visual em breve. Se eles pretendem retomar essa história com a suposta "unificação", já que claramente é uma ponta solta (mesmo que o pouco que esteja ali careça de muitas revisões), espero que façam isso em livros licenciados, ou numa minissérie animada ou em quadrinhos, ou até mesmo em um áudio-drama para o Spotify. Por favor, não arrisquem submeter os jogos a essa mancha uma segunda vez.

De fãs para fãs
Alguns dos novos nomes que se uniram à equipe dos fãs que trabalharam em I-III Remastered incluem Roli (que propôs TR4 HD no passado), Ian Turner (artista), e reborninshadows (Restoration Project, de AOD).

E falando em futuro, seguindo o que aconteceu até aqui, o próximo passo seria remasterizar a saga Legend para fevereiro de 2026, talvez finalmente combinando todos os conteúdos exclusivos das diferentes versões dos jogos em um pacote definitivo, mas além disso eu torço por uma coletânea similar a Jurassic Park: Classic Games Collection ou Teenage Mutant Ninja Turtles: The Cowabunga Collection, reunindo todas as versões dos jogos de Tomb Raider lançadas para consoles portáteis (e, por que não, para celulares) em um pacote para consoles modernos, garantindo a acessibilidade a todos. Esperar para ver, e ver para crer.