
Uma das análises de IV-VI Remastered bem descreve o que eu
sinto, de forma geral, quanto aos jogos inclusos nessa coletânea: eles não são
essenciais. Ao contrário de I-III Remastered, os jogos presentes nessa segunda leva de remasterizações da Aspyr não eram
exatamente populares quando foram lançados décadas atrás, e temo que voltar a
colocar os holofotes em um dos jogos em particular não será exatamente
vantajoso.
Eu já havia
escrito e publicado uma análise no portal PSX Brasil
na ocasião do lançamento, portanto nessa postagem vou me limitar a pensamentos
mais específicos que talvez não fariam sentido para o público em geral — e
provavelmente não são condizentes com pensamentos de outros fãs.
The Last Revelation é gigantesco e maçante. Tentando entrelaçar
com outras atividades e atribuições, fiquei semanas ali: após a primeira
partida, ainda joguei outras duas partidas completas em busca dos troféus
faltantes. Quisera eu estar na minha adolescência, quando o conceito
de tempo parecia tão menos imponente.
Essa remasterização insere movimentos e animações inéditas, algumas das quais
pouquíssimo usei — virar automaticamente para pendurar-se em beiradas aos seus
pés chega a ser inútil, afinal estamos programados para simplesmente rolar ou
recuar da distância certa. Já outros movimentos se provam indispensáveis, como
cambalhotas enquanto rasteja ou para sair de espaços estreitos (ambos já
existiam em I-III Remastered), e, agora, podemos virar enquanto pendurada em barras de teto.
Outro truque "que não está no gibi" é apertar Caminhar duas vezes rapidamente
no inventário para ir imediatamente até os óculos de sol, que centralizam
opções de salvar e carregar a partida, além da indispensável tela de
estatísticas. Isso é importante pois, principalmente em TR4, a quantidade de
itens que Lara carrega simultaneamente beira o ridículo.
Salvo algumas exceções, é seguro dizer que visualmente falando o trabalho continua
absolutamente excelente — na verdade, talvez esteja até melhor que a trilogia anterior. Os efeitos de iluminação estão
magníficos, como as sombras dos pilares em Karnak ou raios solares
ocasionalmente penetrando os céus partidos em Gizé, complementados com
pequenos detalhes como partículas de areia voando.
Essa nova roupagem é deslumbrante, e chega a ser engraçado alternar o modo
gráfico para o visual "original" pois esse agora transparece uma sensação de
ambientes estéreis, vazios e sem vida. Não é necessariamente uma verdade
universal, mas a remasterização tornou até mesmo Cairo um lugar mais tolerável
e interessante de se navegar — da mesma forma que Londres foi essencialmente
salva na remasterização de Adventures of Lara Croft.
Uma mudança que eu não aprovo é fazer com que Lara sofra dano de suas próprias
granadas. Sempre me incomodo quando autores ativam esse recurso em seus
níveis do Level Editor, e aqui não é diferente. Isso torna o lança-granadas
basicamente um peso morto. Felizmente, por algum motivo ou outro, essa lógica não se
aplica à besta, que por si sempre foi uma opção melhor de qualquer forma pelo
alcance e velocidade das flechas explosivas.
Eu ainda considero Atlantean Scion o epítome e o melhor dos jogos da saga
clássica, mas TR4 é o que conta com a melhor história e narrativa — algo que
até então eu erronamente atribuía a AOD. É óbvio que eles queriam dar um
grande desfecho para a protagonista, mas a ganância da Eidos falou mais alto a longo prazo (felizmente?).
E aí entra Chronicles. A história do jogo é fraca, desrespeitando o cânone
ao colocar aventuras em datas contraditórias a eventos já estabelecidos
nos jogos anteriores do próprio estúdio, e acho que é válido considerá-las
como uma série de "e ses...". Eu acho que a abordagem de multiverso
seria ideal para a franquia como um todo, considerando a quantidade de versões de Lara Croft que já vimos entre as diferentes mídias pela qual
a franquia já passou. O conceito de Reflections não era ruim, honestamente,
mas acho que as diferentes iterações não precisam interagir entre si.
Ou, no caso de TR5, podemos usar um argumento que ganha popularidade entre os fãs: tratam-se
de recordações das aventuras sendo contadas por amigos de Lara, e talvez eles
estejam confundido datas ou exagerando certos detalhes, afinal não estavam ao lado da moça o tempo inteiro...
Visualmente, a remasterização também faz um excelente trabalho em dar uma vida
nova a esses cenários. Além da quantidade menor de níveis, os ambientes tendem
a ser menores e mais lineares, talvez por isso o esmero seja mais evidente —
mas não se engane, certos níveis de TR4 contam com tanto carinho
quanto, dentro do que a limitação de tantos túneis e areia permitem.
E, por fim, Angel of Darkness. Joguei do começo ao fim, pela primeira vez, a
versão localizada em português para poder escrever a análise para o PSX Brasil, e
me peguei rindo muitas vezes com o nível de ridículo. Mas não estou
desprezando o trabalho de localização: sob um olhar mais crítico, a
performance original não é em nada melhor, justamente por conta de frases e diálogos esdrúxulos.
Pérolas como "minhas pernas estão mais fortes agora" jamais deveriam ter
saído do papel.
Conforme você progride na campanha, é evidente que a história sofreu
incontáveis cortes, mas a edição final não se sustenta sozinha. Para provar sua
inocência, Lara parte em uma cruzada vingativa contra o mundo inteiro. E em lugares
públicos, mas, felizmente, Paris está deserta. O tal do Monstrum — Eckhardt?
Karel? Quem sabe, afinal — está sempre ao seu redor sem que ela jamais
suspeite. E Karel ser um transmorfo, capaz de mudar até mesmo de roupas
instantaneamente, torna toda a história digna de esculacho. No passado, eu dizia que a história era uma das poucas coisas boas que o jogo tinha. Não mais.
A quantidade de furos no roteiro cresce a medida que o jogo avança. Boaz,
desesperada, afirma que não pôde exterminar o proto-nefilim pois precisava do
fragmento de periapto que estava sob posse de Eckhardt para isso, e, de fato, Kurtis só
conseguiu abater a criatura quando a apunhalou com um de seus
fragmentos. Pouco mais tarde, os três fragmentos são usados para eliminar o alquimista
Eckhardt — que apesar de ser admirador da raça, por si não era um nefilim —,
momentos antes do último nefilim vivo revelar sua real forma.
Na
primeira interação entre os dois, Lara já o conhece por nome e tenta usar
lógica e razão contra ele, tentando convencê-lo a matar o espécime adormecido logo acima
deles. Ele recusa, obviamente. Mas, para sorte de Lara, simplesmente encostar a luva de Eckhardt
na perna da criatura adormecida não apenas cria um raio de luz destrutiva,
como tal raio também segue e atravessa o outro nefilim que até então estava voando em
círculos no local. Zero fragmentos de periapto envolvidos no processo. Baita raça superior. Mesmo o "fracassado" Proto foi tão
mais resistente...
E tendo visto a forma como Eckhardt (ou Karel?) opera, o que diabos atacou
Arnaud afinal? Foi o único sobrevivente dos ataques, mas não parece ter sido nem
profanado, como Von Croy, e nem simplesmente carbonizado, como Luddick. Ao invés, de alguma forma, teve parte de seu corpo transformada em algo completamente diferente de tudo no jogo. E a rapidez com que isso é relevado só realça como nada nesse jogo
funciona.
Aliás, a própria Lara de forma geral se comporta de forma emo e bipolar o jogo
inteiro. Entendo que muitos fãs da franquia sintam algum tipo de conexão ou
nostalgia por esse jogo em particular, ou pela mudança comportamental da
protagonista — certamente agiam da mesma forma em 2003 —, mas não consigo entender. E, honestamente, não quero. Esses mesmos fãs
costumam ser irredutíveis, e francamente todos estamos velhos demais para esse
tipo de discussão sem fim que torna a comunidade como um todo praticamente intolerável.
Mesmo com as restaurações que o jogo recebeu, continua sendo o mesmo jogo
de outrora, mas os controles modernos o tornam ligeiramente mais
palatável. Ligeiramente. Continuei dependente do recurso de salvamento e
carregamento rápido para praticamente todos os pulos e seções de plataforma,
pois muitas das animações dos protagonistas continuam lerdas e irresponsivas demais. Isso sem
falar no combate, que continua tão ruim quanto eu lembrava. De forma geral,
simplesmente não é um jogo divertido. (E no New Game+, então, menos ainda.)
Ao contrário das outras cinco remasterizações, visualmente AOD pouco
parece melhor que a versão original. Na maior parte do tempo, parece
apenas ser um pacote de texturas de alta definição, com exceção dos modelos de (alguns)
personagens. Quando eu conferi Soul Reaver 1 & 2 Remastered, citei que
isso poderia vir a acontecer com base no pouco que víamos no material promocional do
jogo.
Enfim, como eu disse lá no começo, hoje tenho certo receio do que a Crystal
Dynamics planeja para o futuro da franquia, intencionalmente colocando
holofotes nesse "injustiçado" título — e recentemente ainda tivemos uma skin
para Fornite, e suspeita-se que existirá uma Funko Pop com esse visual em
breve. Se eles pretendem retomar essa história com a suposta "unificação", já
que claramente é uma ponta solta (mesmo que o pouco que esteja ali careça de
muitas revisões), espero que façam isso em livros licenciados, ou numa
minissérie animada ou em quadrinhos, ou até mesmo em um áudio-drama para o
Spotify. Por favor, não arrisquem submeter os jogos a essa mancha uma segunda vez.
De fãs para fãs
Alguns dos novos nomes que se uniram à equipe dos fãs que
trabalharam em I-III Remastered incluem Roli (que propôs
TR4 HD
no passado), Ian Turner (artista), e reborninshadows (Restoration Project, de AOD).
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E falando em futuro, seguindo o que aconteceu até aqui, o próximo passo seria
remasterizar a saga Legend para fevereiro de 2026, talvez finalmente
combinando todos os conteúdos exclusivos das diferentes versões dos jogos em um
pacote definitivo, mas além disso eu torço por uma coletânea
similar a
Jurassic Park: Classic Games Collection
ou
Teenage Mutant Ninja Turtles: The Cowabunga Collection, reunindo todas as versões dos jogos de Tomb Raider lançadas para consoles
portáteis (e, por que não, para celulares) em um pacote para consoles modernos,
garantindo a acessibilidade a todos. Esperar para ver, e ver para
crer.